Sobre o Sahel e a Europa
Este é o link para o meu texto desta semana no Diário de Notícias, publicado na edição de hoje.
A presença europeia no Sahel, que tem custos muito elevados, precisa de ser avaliada, revista e reorientada.
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Este é o link para o meu texto desta semana no Diário de Notícias, publicado na edição de hoje.
A presença europeia no Sahel, que tem custos muito elevados, precisa de ser avaliada, revista e reorientada.
https://www.dn.pt/edicao-do-dia/31-out-2020/a-caricatura-de-um-politico-megalomano-12981987.html
Link para o meu texto desta semana no Diário de Notícias.
Mais um atentado, mais um cenário de horror, mais uma vez a necessidade de repudiar este tipo de crimes, mais um lembrar que as palavras violentas acabam por se traduzir em acções violentas. Nice já tinha conhecido cenas de horror terrorista no passado recente, quando um camião foi utilizado, a 14 de Julho de 2016, para matar 86 pessoas inocentes e ferir mais de 400. Hoje, foi numa igreja, com uma faca, que é o instrumento mais em conta que um jovem terrorista pode obter.
Por outro lado, também hoje, a multidão que foi ver as ondas gigantes à Nazaré me lembrou que a estupidez humana pode tomar várias formas. O terrorismo é a forma extrema. Ir aos magotes e sem máscaras nem distanciamento à Nazaré deve ser visto como uma forma atenuada da cretinice de muitos. O problema é que essa imbecilidade propaga o vírus e o vírus mata.
O governo deveria ter emitido uma nota sobre esses amadores da nova onda.
A França está novamente em estado de choque, depois do assassinato de um professor do ensino secundário por um terrorista fanático do Islão. Assistimos hoje a manifestações de pesar em várias cidades francesas. Ao mesmo tempo que se chorava a morte do professor, Samuel Paty, dizia-se de maneira clara que a população não se deixa intimidar. Essa mensagem é fundamental. Os terroristas não podem conseguir plantar a semente do medo.
Queria deixar aqui uma homenagem aos seis jovens trabalhadores humanitários, membros da ACTED, uma ONG francesa que opera em vários países em crise, e aos dois acompanhantes nigerianos (Niger) que este domingo foram barbaramente assassinados por terroristas islamistas, a cerca de uma hora de carro de Niamey. Infelizmente, esta zona do Sahel, que compreende vários países, está cada vez mais ameaçada pelo terrorismo. As forças armadas e de segurança desses países não conseguem assegurar a segurança dessa vasta área, apesar da assistência militar francesa, norte-americana e de outros países europeus. A execução destas oito pessoas a sangue-frio veio tornar ainda mais difícil a presença de organizações internacionais na região. A pobreza e a falta de perspectivas são cada vez mais reais. Sem apoio externo, sem economia, sem segurança, o Sahel só pode ir de mal a pior.
Ontem passei uma parte da tarde a discutir a situação explosiva que se vive no Sahel e que alastra agora a outras partes da África Ocidental e Central. O objectivo era o de procurar novas pistas de intervenção, para além das respostas de segurança e de desenvolvimento. Estas duas áreas já provaram que não são suficientes para tratar da crise. Continuam, no entanto, a ser as principais apostas, quer dos governos locais quer ainda dos actores exteriores, como por exemplo a União Europeia. Por razões que têm muito mais que ver com os interesses das elites locais e com a predominância da visão securitária que prevalece em França e em certos círculos europeus.
Hoje, ao percorrer o programa da Conferência de Munique sobre a Segurança, cuja versão anual decorre até domingo, notei que o Sahel e a África em geral não estão na agenda. Apenas a Líbia fará parte das discussões. Como a agenda reflecte as preocupações dos dirigentes alemães, fiquei a pensar que Berlim ainda não entendeu o que se passa na metade de África que fica mais vizinha da Europa. Se assim for, temos aqui uma grande falha de apreciação.
Começou a Cimeira da União Africana, um encontro anual que não deve ser ignorado. O Presidente da Comissão Africana, Moussa Faki, um Chadiano de grande valor, de quem sou amigo e por quem tenho um grande respeito, fez um excelente diagnóstico dos principais problemas que o Continente enfrenta. Referiu-se, nomeadamente, às acções terroristas no Sahel, na Bacia do Lago Chade e no Corno de África. Lamentou, igualmente, que se tenha estado a assistir a uma proliferação dos conflitos entre comunidades. E pôs a acento tónico na procura da paz e na criação de oportunidades para a juventude africana.
A União Europeia esteve bem representada neste dia de abertura. Foi importante ver Charles Michel e Ursula von der Leyen em Addis Ababa. Espero que os seus conselheiros lhes tenham dito que vale a pena trabalhar em cooperação com Moussa Faki. Este é o último ano do mandato de Moussa Faki e o primeiro dos dirigentes europeus. Há que aproveitar o tempo disponível.
Ontem foi a propósito do grave incidente na Ponte de Londres. Para além dos factos, as televisões passaram horas a comentar o ataque. Puseram, como de costume, câmaras e microfones à frente dos especialistas na análise do terrorismo – a malta habitual – que discorreram sobre o assunto quando nada de concreto se sabia sobre o autor, as possíveis motivações, as circunstâncias para além do que acontecera na Ponte, etc. Se tivesse paciência para os ouvir, ficaria certamente pasmado. Emitem tanta teoria sobre um assunto em relação ao qual falta toda a informação que é essencial. São uns criativos. E servem para encher espaço.
Apercebi-me há pouco que estamos prestes a entrar na terceira década do Século XXI. O passo seguinte foi ficar pasmado ao reconhecer que continuamos a pensar e a falar de política como o fazíamos nos anos 70 ou 80 do século passado. Isto, apesar das enormes mudanças que entretanto ocorreram e dos desafios completamente diferentes que agora temos que enfrentar.
O grupo terrorista Estado Islâmico anunciou hoje o nome do seu novo “Califa”, bem como do novo porta-voz. Não sabemos ainda quem se esconde por detrás dos nomes anunciados, quem são de facto essas pessoas. O tempo dirá.
Mas haverá duas verdades que convirá ter em conta.
Por um lado, nos últimos meses, muitos dos seus principais líderes foram eliminados. Chama-se a isso “decapitar” a organização, destruir o seu núcleo dirigente. O impacto dessas acções de decapitação é difícil de medir. Existem várias dissertações sobre o assunto, com conclusões divergentes. Apesar disso, deve reconhecer-se que a morte desses dirigentes deve ter abalado profundamente a organização, sobretudo nesta fase de acumulação de derrotas. Creio poder dizer, sem grandes hesitações, que a estrutura existente na Síria e na fronteira com o Iraque está bastante esfarrapada.
A outra dimensão tem que ver como as ameaças futuras. Seria um erro pensar que, depois de todos estes assassinatos, a organização deixou de ter capacidade para planear e levar a cabo atentados terroristas. O perigo continua a existir, na Síria, à volta da Síria e para além da região. Existem células clandestinas e existe um meio social e político propício a este tipo de radicalismo extremamente violento, vingativo e fanático. Por isso, a luta contra o Estado Islâmico não pode, de modo algum, ser dada como ganha.
E aqui convém lembrar que os aliados mais efectivos na prossecução desse combate são os combatentes curdos na Síria. A Europa, e não só, tem que mostrar que é fiel à aliança que precisa de manter com essas milícias curdas.
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