A minha carreira internacional, sobretudo nos últimos anos, em que a responsabilidade política era maior, ensinou-me que o sucesso passa por um equilíbrio muito delicado entre o chamar os bois pelos nomes e a sensibilidade dos grandes países. Ou seja, quando a verdade precisa de ser dita deve-o ser, mas a escolha das palavras, do momento e do local são questões fundamentais. A diplomacia, como é costume dizer-se, consiste na capacidade de mandar a outra parte para o inferno com um jeito tal que deixe o adversário com vontade de fazer a viagem e ansioso por lá chegar o mais depressa possível.
As relações com os grandes países, quando se tem responsabilidades internacionais, não se fazem através dos jornais nem com declarações bombásticas. A não ser que se tenha perdido a autoridade, a capacidade de ser ouvido, ou se esteja com um pé já na rua…
Dito isto, não sei como enquadrar a entrevista de Barroso ao International Herald Tribune. No entanto, ao atacar de um modo tão claro o governo de François Hollande, o Presidente da Comissão Europeia pode ter revelado, indirectamente, várias coisas: frustração, porque a Comissão tem estado a ser ostensivamente marginalizada em tudo o que conta; presunção, por acreditar que possa estar acima dos líderes dos Estados membros, o que nunca poderá ser aceite; ou mau aconselhamento, por parte dos seus assessores políticos. Fica a questão no ar. O que é verdade, é que assim vai voltar a Lisboa mais cedo do que ambicionava. Ou então, vai seguir os passos de Tony Blair e andar por aí, a dar conselhos a governos que paguem bem.
Nas suas memórias, Tony Blair escreve que as remodelações governamentais são sempre muito complexas e muito dadas a erros. Diz mesmo que a remodelação de 2006, a última que fez antes de sair do governo, no ano seguinte, lhe trouxe mais inimigos e problemas que amigos e apoios. Em certa medida, as memórias dão a entender que quando Blair se sentia atacado por todos os lados, o que era o caso na altura, graças nomeadamente às ambições de Gordon Brown e do seu grupo, a probabilidade de errar na escolha dos membros do governo era maior.
Eu acrescentaria, para além de estar de acordo com a confissão de Blair, que não proceder a remodelações ministeriais é igualmente um erro muito grave. Quando um primeiro-ministro vê, todos os dias, que um ministro é um pedregulho atado ao pescoço do governo, a puxá-lo constantemente para o fundo, e não o substitui, esse primeiro-ministro está a cometer um erro de grandes consequências. Mostra falta de faro político e pouca liderança.
Tony Blair acaba de publicar as suas memórias de homem público com muitas confissões privadas. De tudo o que o que escreve sobre a sua viagem pessoal, sobressai a personalidade de um político que pensa que o mundo deveria girar à sua volta, que não perdoa nem se autocritica, que está convencido que sempre teve razão. Mas o mais feio, são os ataques pessoais a um outro político, de quem foi muito amigo, companheiro de vitórias eleitorais, e que agora atraiçoa. Talvez porque atacar os outros seja uma maneira de desviar as atenções das nossas insuficiências e erros.