Aconselho alguma prudência aos analistas habituais, quando chamados a pronunciar-se sobre os atentados de ontem no Sri Lanka. A situação política interna é muito complexa e o que aconteceu tem uma dimensão de política doméstica muito grande. Polícias especialistas em terrorismo, vindos da Europa e dos Estados Unidos, vão estar no país para acompanhar de perto as investigações que as autoridades nacionais já têm em curso.
Para já, o que é claro tem que ver com a dimensão, o comando e controlo desta operação terrorista – tudo feito de modo muito organizado, o que significa estarmos perante uma rede altamente preparada e não face a meros amadores suicidas. E também é claro que os autores procuraram obter um impacto com grande visibilidade internacional.
Serão estas as duas linhas de partida que irão guiar as investigações, para além duma averiguação extremamente detalhada dos círculos de pessoas e dos grupos ligados aos bombistas-suicidas. E de uma análise das falhas de coordenação entre os diferentes serviços nacionais de segurança, uns dependentes do Presidente e outros do Primeiro-Ministro.
Convém evitar a tentação de encontrar bodes-expiatórios fáceis, ao alcance da mão. A gravidade do que aconteceu exige um inquérito a fundo. Haverá muito que aprender. Nomeadamente, em termos de prevenção, para evitar, na medida possível, que as tragédias de ontem não se repitam noutros pontos do globo.
Este domingo de Páscoa ficará marcado pela extrema violência dos atentados praticados hoje no Sri Lanka e que tiveram como alvos igrejas católicas e hotéis frequentados por turistas estrangeiros. Foram actos profundamente chocantes, com consequências devastadoras, quer em vidas quer ainda para a tranquilidade que o país tem procurado estabelecer nos últimos anos.
Não se sabe ainda, apesar das especulações que por aí circulam, quem deve ser responsabilizado por estes crimes hediondos. Mas tem que haver uma condenação muito firme destas acções terroristas. Todos os quadrantes de opinião e de cultura devem expressar horror e solidariedade. E deixar as polícias continuar o trabalho de investigação que se impõe. Depois se falará de responsabilidades.
O drama da imigração ilegal, por via marítima, conheceu hoje mais um pico de tragédia, com mais de 700 vidas perdidas nas águas do Mediterrâneo. Falar de outra coisa, num dia como este, seria um absurdo. O momento exige que se pense a sério numa solução para o vastíssimo – e extremamente complexo – problema que tudo isto representa. Essa seria a melhor homenagem que se poderia fazer à memória dos que hoje e quase todos os dias, continuam a perder a vida, num desespero sem fim.
Com o mundo cada vez mais computorizado, uma situação que torna a vida moderna totalmente dependente do bom funcionamento dos sistemas informáticos, as guerras do futuro passar-se-ão nas salas de programação software, com centenas de jovens na casa dos vinte anos a desenhar emaranhados complexos de vírus destinados a atacar os sistemas informáticos inimigos.
É a guerra cibernética. Uma guerra sem uniformes, de gente vestida com jeans e t-shirts, alimentada a hambúrgueres e coca-colas. Estas serão as rações dos combatentes dos tempos que se aproximam. As trincheiras serão as mesas dos computadores, as armas, a matemática, a programação, a engenharia de sistemas, as ligações em rede, os fire walls e a sofisticação das senhas de acesso aos programas. Os novos combatentes não vão precisar de se ausentar de casa. Continuarão a ter uma vida de família normal, a entrar para o emprego a horas regulares, a ir ao cinema à noite e aos dancings ao fim-de-semana. Saem da guerra a horas certas e desligam, psicologicamente falando.
Esta nova frente de conflito, este novo tipo de ataques preventivos, defensivos ou malignos obrigará a repensar por completo os sistemas de defesa. Os meios clássicos passarão a ter menos peso. Serão ainda necessários, como é óbvio. Mas estarão, muito provavelmente, mais voltados para o combate contra as rebeliões e os grupos terroristas ou piratas. Para fazer frente às ameaças assimétricas, ou seja, provenientes de combatentes irregulares, estruturados de maneira simples e constituídos em pequeno grupos. No entanto, mesmo este tipo de intervenções estará cada vez mais informatizado. Basta ver o que se passa com os pequenos aviões sem piloto - os UAV - para entender que se pode ter um centro de comando dessas máquinas no Algarve, à beira da praia, e fazer voar os ditos objectos, mesmo se estacionados no pólo oposto. E, assim, atacar com uma precisão cada vez maior os alvos seleccionados.
Bombardear uma central nuclear, num país hostil, por exemplo, terá um outro significado. Não serão mobilizados aviões e mísseis. Nem comandos especiais. Serão bombardeados com programas de computação que criem o caos nos sistemas de gestão informática da central.
Dizem que é o que já está a acontecer no caso concreto do Irão. Penso que é cedo para tirar conclusões sobre o que se está a passar numa das centrais desse país. Mas a notícia mostra claramente que já estivemos mais longe de uma ofensiva desse tipo.
A tragédia que o Haiti está a viver toca-nos muito. Tenho, na minha Missão, vários funcionários de nacionalidade haitiana. Estão como que paralisados, o choque foi demasiado grande. A nossa equipa de aconselhamento psicológico, um pequeno conjunto de especialistas que está muito habituado a lidar com traumas violentos, em zonas de conflito, tem estado em contacto com os colegas que ficaram mais fragilizados.
O chefe da Missão da ONU no Haiti, Hédi Annabi, um velho colega meu, e o seu adjunto, o Luís da Costa, outro conhecido de muitos anos, continuam desaparecidos. Estavam, mais o Comandante da Força Militar da ONU, o Comissário da Polícia (UNPOL) e outros colegas seniores, numa reunião com uma delegação chinesa. Receia-se que tenham, todos, perdido a vida.
O destino é o que é. O General Gerardo Chaumont, um homem bom, argentino e com muita experiência em matéria de segurança, antigo comandante-geral adjunto da Gendarmeria Argentina, trabalhou um ano e meio comigo no Chade. Em finais de Dezembro, resolveu aceitar a sua transferência para a Missão no Haiti. Por ser mais perto de Buenos Aires. Queriam que fosse directamente de N'Djaména para Port-au-Prince. Se tivesse acedido, teria morrido ontem. Mas, não. Disse que só começaria as suas novas funções em Fevereiro. Quando o fizer, encontrará um Haiti destruído e à deriva.
Despachei para Bangui o meu director de gabinete e o o conselheiro político sénior. No seguimento das minhas conversas telefónicas de ontem com o Primeiro-Ministro Toadera, os enviados especiais reuniram-se, esta tarde, com o PM e uma equipa de crise. Estiveram também com a embaixador francês e com as ONGs que operam em Birao. Lancei, entretanto, um apelo para que os reféns sejam libertos sem demoras. São jovens de bem, dedicados e com reconhecido trabalho social de apoio às comunidades de Birao.
Entretanto, a notícia dos raptos foi título grande nos meios de comunicação social franceses. O facto de os raptores procurarem vítimas dessa nacionalidade foi o tema central.
Enquanto tratava deste assunto, a tripulação do helicóptero que havia sido enviado para Birao, como apoio à procura dos criminosos, teve ontem uma noite muito dramática. Um dos pilotos faleceu, três outros estão em estado grave. Em coma. Beberam um líquido adquirido sabe-se lá onde, mas que tinha um rótulo de uma bebida espirituosa normal.
Foi o segundo incidente do género em duas semanas. Com pessoas da mesma nacionalidade. Embora estivesse em Vevey, por outros motivos profissionais, passei uma parte da manhã a falar com Moscovo. Mais tarde, com Nova Iorque e com a minha área de operações. A pedir que as autoridades do país dos pilotos sensibilizem as suas gentes, para que estes casos tão trágicos não voltem a acontecer.